A entrevista que José Vasconcelos e Souza d’Andrade concedeu a Miguel Ortega Cláudio não podia ter sido mais oportuna. O ganadero falou com desassombro e arrasou tudo e todos. Empresários, cavaleiros, ganaderos, críticos e até os portugueses em geral são culpados de uma festa deveras negra. Na véspera de Santarém, em que se lidou um curro daquele ferro, a entrevista estalou como bomba e as reacções fizeram-se sentir entre os vários visados.
Quis o destino que os toiros saíssem em perfeita ilustração das palavras do ganadero. Não foram de corda, nem mansos, nem parvos, nem cómodos – tudo ao contrário; saíram a pedir contas, com sentido, encastados, com génio e a dar trabalho, além de uma rematada apresentação.
Curiosamente, foi Filipe Gonçalves a convidar e insistir a que o maioral da ganadaria de Vasconcelos e Souza d’Andrade tivesse honras nos médios. Entre as duras palavras do ganadero encontrava-se a referência intrínseca ao cavaleiro algarvio e este pareceu determinado em “responder directamente” às afirmações.
Filipe Gonçalves fez da grande lide da tarde quase tudo o que desagrada ao ganadero. Impôs-se ao toiro com reuniões ao estribo em quiebros «de assustar», teceu a brega a ladear, adornou os cites e cravou um enorme par de bandarilhas – com uma entrega e uma valentia tais que soou a “desforra”. O público agradeceu e reconheceu com ovações de pé!
O antes e depois de Filipe Gonçalves também se viu com interesse embora nem sempre os cavaleiros tenham estado «por cima» dos oponentes.
Joaquim Bastinhas lidou um quatreño com génio e encastado que perseguia com ganas de colher mas que se frenava nas reuniões. O cavaleiro esteve a gosto e escutou música ao primeiro curto. Lidou com acerto e «meteu» o público na corrida.
O segundo da tarde coube a Rui Salvador. Saiu enraçado, com ganas de repetir no capote. Embora algo distraído, o toiro transmitiu e deu lugar a uma actuação redonda e com sonantes ferros, dos quais o primeiro comprido cravado de frente, ficou na retina.
Luís Rouxinol sofreu um violento toque ao segundo comprido. Com sentido e sério, o toiro adiantava-se à montada e investia com ganas de colher. O cavaleiro teve que puxar dos galões para resolver e assim fez com solvência.
Também não era fácil o oponente que tocou a Sónia Matias. O toiro esperava mas empregava-se no momento do ferro resultando em reuniões duras que soaram a dificuldade. A cavaleira cumpriu a ferragem da ordem e terminou com dois violinos que chegaram à bancada.
Por fim, seguindo-se a Filipe Gonçalves, Marcos Bastinhas teve menos sorte com o oponente que lhe tocou. Com evidentes problemas de visão, o toiro andou quase sempre solto e a lide acabou por ser desligada entre vários “perigosos” bons ferros.
No capítulo das pegas ambos os grupos sentiram as dificuldades do génio dos Vasconcelos.
Pelos Amadores de Santarém abriu praça Diogo Sepúlveda. Deixou o toiro vir de largo e esteve enorme a cumprir os tempos: esperou para alegrar o toiro e recuar obtendo uma eficaz reunião. David Inácio foi também tecnicamente exemplar e consumou à primeira tentativa. João Torres Vaz Freire desequilibrou-se a recuar e não obteve reunião ao primeiro intento. À segunda tentativa adiantou-se e saiu desfeiteado. À terceira esteve grande a pisar a jurisdição para tirar o toiro das tábuas, levou-o toureado e reuniu com garra.
Os Amadores de Alcochete tiveram tarde dura. Diogo Timóteo viu o toiro investir a apalpar, tentou compor mas veio descomposto e acabou por sair. À segunda recebeu o toiro com um piton por alto e não conseguiu fechar-se. À terceira consumou pega dura com o toiro a bater e foi determinante a boa primeira ajuda. Vasco Pinto teve uma dura primeira tentativa com o toiro a derrotar para o tirar. À segunda esteve perfeito levando o toiro com suavidade a recuar para se fechar com eficácia. A última pega coube a Tomás do Vale que tinha por diante um toiro quase cego. À primeira tentativa o toiro desviou caminho ao forcado, que assim só à segunda teve hipótese de resolver.
A praça de toiros Celestino Graça celebrava nesta corrida o seu quinquagésimo aniversário. No intervalo foram descerradas quatro placas de homenagem a Celestino Graça, César Marinho, Pedro Gonçalves e cinquentenário do tauródromo.
