A tarde do cortejo em Coruche é imperdível. Não há, como nas festas da Senhora do Castelo, tanta alegria nas ruas e tanto sabor a Ribatejo. Já bem perto da hora marcada para a corrida, é um quadro soberbo a imagem os jogos de cabrestos e dos campinos trajados a rigor junto ao Mural dos Toureiros, rodeados de gente que assiste à tradicional homenagem ou vai entrando para a corrida.
Entre o sol poente e quente da tarde, a praça encheu cerca de três quartos dos seis mil lugares que acolhe e estava uma bonita moldura humana.
Pena que a tarde dos Veiga Teixeira tenha sido de escassa emoção e que tenham sido raros os momentos de verdadeiro deleite.
Esses momentos tiveram lugar com os da casa: António Telles e os Amadores de Coruche protagonizaram os papéis mais gratos no seu próprio palco – o primeiro arrebatou-nos com a segunda lide, soberba! – os segundos, pela técnica exemplar das primeiras pegas e pela união e humildade frente à dureza das duas últimas.
António Telles começou por abrir a função frente a um oponente de investida curta, que pouco se empregava. Sem prejuízo sobre a boa execução e colocação dos ferros de frente, em terrenos medidos, temos que dizer que a lide não passou da regularidade no que à “pincelada artística” se refere. Por oposição, o ginete da Torrinha esteve sublime frente ao segundo – mesmo que nem em todos os ferros se tenha visto “aquela” reunião. Esteve belíssimo a levar o toiro na brega da porta gaiola aos médios e igualmente nos dois primeiros compridos de praça a praça com o toiro bem por diante, aproveitando-lhe a chispa com que saiu dos curros. Depois, com todo o sítio, andou templado, ligado e de todo paciente para colocar o toiro em sorte, retirá-lo da querençae cravar os ferros com o seu selo único. O toiro faltava nas reuniões, mas isso não retirou ao conjunto o deleite que proporcionou. Distinto!
Luís Rouxinol encontrou no primeiro Veiga Teixeira um oponente francamente reservado e distraído, que não emprestou emoção nem deu jogo. Uma brega interessante no início e entre os primeiros ferros, cites terra-a-terra, um violino a passar por dentro, um palmo nos médios e um quarto ferro de nota alta entre os outros bem colocados, não passaram do morno apesar do empenho do ginete. Já na segunda parte, lidou o melhor exemplar do curro (que inclusivamente voltou para a ganadaria) que abriu com a lide, que veio também de menos a mais. Tendo o público consigo, Rouxinol fez o possível e agradou. Em particular com o segundo curto, bem aguentado para cravar de poder-a-poder, no quarto e nos adornos. Um grande par, ao estribo e um palmo nos médios – agora sim com o som devido.
João Salgueiro passou mais em claro esta tarde. O primeiro, que saiu com som, levou-o na brega pelas tábuas deixando-o o em sorte para a ferragem comprida. Foi cerceando os terrenos à medida que a lide ia evoluindo, já que o toiro veio sempre a menos. Ainda assim, ficaram na retina o segundo e quinto curto de reunião cingida e quase milimétrica, as bonitas piruetas nos cites e um conjunto equilibrado face à matéria-prima que ali teve.
Na segunda parte nem houve toiro nem houve Salgueiro. Se o toiro parado, a procurar distracção, manso e sem investida não ajudou, a sorte também não foi muita já que entre os poucos ferros que deixou caíram vários. Com ou sem culpa do cavaleiro para o mau resultado desta lide, certo é que o toiro ficou inteiro para a pega e não houve nenhum esforço do cavaleiro para o evitar. A pega é um conjunto que se une à lide – se muitas vezes os cavaleiros dão voltas apoiados no brilho dos forcados, não devem esquecer-se deles antes de encolher os ombros…
Os Amadores de Coruche, encerraram-se pois com os seis Veiga Teixeira, que apesar do comportamento, eram rematados e bem apresentados – num peso médio de 500kg.
O cabo, Amorim Ribeiro Lopes, abriu a tarde com uma rija primeira tentativa, em que apesar de ter aguentado à córnea grande parte da viagem até tábuas foi empurrado para baixo sem hipótese ante a investida sempre baixa e a tirar a cara. Ao segundo intento, com eficaz correcção dos tempos, não saiu da córnea onde vinha com decisão aguentando a viagem áspera do oponente.
Luís Carlos consumou uma correcta pega à córnea, mandando na investida até à reunião a que correspondeu uma eficaz primeira ajuda lateral.
Miguel Raposo executou à primeira uma pega bonita à córnea em técnica exemplar, a que a viagem por alto e a desviar do grupo, emprestaram espectacularidade.
Ricardo Dias consumou também ao primeiro intento, com uma grande primeira ajuda, uma pega dura em que aguentou vários derrotes que não o tiraram da córnea onde foi eficaz,viagem a empurrar até às tábuas.
João Peseiro não encontrou facilidades, já que o poder dos derrotes o tiravam violentamente da cara, onde nas três primeiras tentativas ainda conseguiu acoplar-se. Consumou à quarta à barbela com a ajuda carregada, aguentando fortíssimos derrotes seguidos para tirar o grupo, que fechou coeso.
Por fim, Alberto Simões pegou à terceira tentativa o último toiro da tarde, que vinha inteiro da lide e que empregou nos forcados tudo o que não empregara no cavalo. Duas tentativas em que a brutal violência da reunião impediu que o forcado se fechasse, a que se seguiu a pega consumada à terceira, com grande coração do forcado para concretizar – suportando a entrada dura e fortíssimos derrotes a que o grupo correspondeu coeso.
Sara Teles